Monday, February 26, 2018

HISTOIRE D'O (parte 4)





CAPÍTULO 3
ANNE-MARIE E OS ANÉIS

Para encontrar uma desculpa, O pensava, ou gostaria de pensar, que Jacqueline lhe resistiria. Assim que se decidiu, esse engano se desfez. Os ares pudicos que Jacqueline tomava, fechando a porta do pequeno cômodo do espelho onde punha e tirava os seus vestidos, destinavam-se precisamente a atrair O e a dar-lhe o desejo de ultrapassar uma porta que, aberta, não se decidia a ultrapassar. Que a decisão de O viesse finalmente de uma autoridade fora dela e não fosse resultado dessa estratégia elementar, Jacqueline estava longe de imaginar. No começo, O divertiu-se com isto. Quando ajudava Jacqueline a pentear-se, ou quando Jacqueline, tendo tirado as roupas com as quais tinha posado, vestia sua malha justa no pescoço e colar de turquesas semelhantes a seus olhos, O experimentava um incrível prazer com a ideia de que nesta mesma noite Sir Stephen saberia cada um de seus gestos: se Jacqueline tinha-a deixado tocar seus seios separados e pequenos através da malha negra, se suas pálpebras tinham se abaixado tocando o rosto com os cílios mais claros que sua pele, se tinha gemido. Quando O a beijava, ela se tornava pesada, imóvel e atenta em seus braços, deixava sua boca entreabrir-se e seus cabelos caírem nas costas. O precisava sempre ter o cuidado de apoiá-la contra o batente de uma porta ou numa mesa, de segurá-la pelos ombros. De outra forma teria caído ao chão, com os olhos fechados, sem uma queixa. Assim que O a deixava, voltava a ser de névoa e de gelo, risonha e estrangeira, dizia: "Você me sujou de batom", limpando a boca. Era a esta estrangeira que O amava trair, observando com toda a atenção -- para não se esquecer de transmitir nada -- o lento rubor de suas faces, o cheiro de mato do seu suor. Não se podia dizer que Jacqueline se defendesse ou que desconfiasse. Quando cedia aos beijos de O -- e por enquanto só lhe tinha concedido beijos, que recebia mas não restituía --, cedia bruscamente, e dir-se-ia totalmente, tornando-se repentinamente outra pessoa, por dez segundos, ou por cinco minutos. Durante o resto do tempo, era simultaneamente provocante e fugidia, de uma incrível habilidade para esquivar-se, arranjando-se sem nunca cometer um erro para não arriscar que algum gesto, alguma palavra, ou mesmo algum olhar, permitisse coincidir a triunfante com a vencida, e que se acreditasse que fosse tão fácil assim forçar sua boca. O único indício pelo qual seria possível guiar-se, e talvez suspeitar a inquietação próxima sob a água do seu olhar, era às vezes a sombra involuntária de um sorriso em seu rosto triangular, semelhante a um sorriso de gato, igualmente indeciso e fugaz, igualmente inquietante. O, entretanto, não demorou a perceber que duas coisas faziam com que ele aparecesse, sem que Jacqueline tivesse consciência disso. A primeira era os presentes que lhe davam e a segunda, a evidência do desejo que inspirava -- com a condição entretanto de que este desejo viesse de alguém que pudesse ser-lhe útil ou que a lisonjeasse. De que forma, então, O lhe era útil? Ou quem sabe, por alguma exceção, Jacqueline simplesmente sentia prazer em ser desejada por ela, fosse porque a admiração que O lhe devotava representava um conforto, fosse porque o desejo de uma mulher é sem perigo e sem consequências? Entretanto, O estava persuadida de que se tivesse oferecido a Jacqueline, em vez de um broche de madrepérola ou do último lenço de Hermès com Eu te amo impresso em todas as línguas do universo, do japonês ao iroquês, os dez ou vinte mil francos que pareciam constantemente faltar-lhe, Jacqueline teria parado de, praticamente, nunca ter tempo para vir almoçar ou tomar lanche na casa de O, ou de esquivar-se às suas carícias. Mas O nunca teve provas disso. Acabara de contar isso a Sir Stephen, que recriminava sua lentidão, quando René se intrometeu. Nas cinco ou seis vezes em que René tinha vindo buscar O, quando Jacqueline estava no estúdio, os três tinham ido juntos ao Weber ou a um dos bares ingleses perto da Madeleine; René olhava para Jacqueline exatamente com aquela mistura de interesse, de segurança e de insolência com que olhava em Roissy as moças que estavam à sua disposição. Sobre a brilhante e sólida armadura de Jacqueline, a insolência escorregava sem atingi-la; Jacqueline nem sequer a percebia. Por uma curiosa contradição, O sentia-se atingida, achando insultante para com Jacqueline uma atitude que achava justa e natural para com ela própria. Queria tomar a defesa de Jacqueline ou desejava ser a única a possuí-la? Ser-lhe-ia bem difícil dize-lo, tanto mais que não a possuía -- ainda não. Mas se chegou a consegui-lo, é necessário reconhecer que foi graças a René. Por três vezes, saindo do bar, onde tinha feito Jacqueline beber muito mais uísque do que devia -- ficava com as maçãs do rosto rosadas e brilhantes e com os olhos duros --, tinha-a levado em casa, antes de ir com O para a casa de Sir Stephen. Jacqueline morava numa dessas sombrias pensões de família de Passy, onde os russos brancos tinham se amontoado nos primeiros dias de emigração, e de onde nunca mais tinham saído. O vestíbulo era pintado imitando o carvalho, os balaústres da escada estavam cobertos de poeira nas cavidades e grandes manchas esbranquiçadas pelo uso marcavam os carpetes verdes. Todas as vezes em que René -- que nunca tinha ultrapassado a porta -- queria entrar, Jacqueline gritava que não, muito obrigada, e saltando para fora do carro, batia a porta atrás de si como se alguma língua de chama subitamente a tivesse atingido e queimado. E como era verdade, pensava O, que estava sendo perseguida pelo fogo! Era incrível que o adivinhasse, quando nada ainda a tinha instruído. Pelo menos sabia que devia tomar cuidado com René, por mais insensível ao seu desprendimento que parecesse ser (mas era real esse desprendimento? E quanto a parecer insensível, eram dois no jogo, pois um valia bem o outro). A única vez em que Jacqueline deixara O entrar em sua casa e acompanhá-la ao seu quarto, compreendera por que recusava tão ferozmente a René a permissão para entrar. O que teria acontecido com seu prestígio, com sua lenda preta e branca sobre as páginas brilhantes das luxuosas revistas de moda, se alguém, que não fosse uma mulher como ela, tivesse visto de que sórdido covil saía todos os dias o animal lustrado? A cama nunca estava arrumada, apenas coberta, e o lençol era cinza e engordurado, pois Jacqueline nunca se deitava sem cobrir seu rosto com creme e dormia muito rápido para pensar em secá-lo. De uma cortina, que antigamente deveria cobrir a cabine do toilette, restavam apenas dois anéis sobre o reposteiro, de onde pendiam ainda alguns fiapos. Nada mais tinha cor, nem o tapete, nem o papel cujas flores rosas e cinzas subiam como uma vegetação que tivesse se tornado louca e petrificada sobre uma falsa treliça branca. Seria necessário arrancar tudo, deixar as paredes nuas, jogar fora os tapetes, raspar o assoalho. Em todo o caso, retirar imediatamente as linhas de gordura que, como extratos, riscavam o esmalte do lavabo; limpar e pôr em ordem imediatamente os frascos de cremes de limpeza e de outros cremes, limpar o pó-de-arroz, a penteadeira, jogar fora os algodões sujos, abrir as janelas. Mas, altiva, fresca e limpa, cheirando a lavandas e a flores selvagens, impecável, imaculada, Jacqueline pouco se importava com seu chiqueiro. Por outro lado, o que a incomodava e lhe pesava, era sua família. Foi por causa do chiqueiro, sobre o qual tivera a candura de falar, que René sugeriu a O que fizesse a proposta que devia mudar sua vida, mas foi por causa de sua família que Jacqueline aceitou. Era que Jacqueline viesse morar com O. Dizer uma família era pouco: era mais uma tribo, ou melhor, uma horda. Avó, tia, mãe, e até uma criada, quatro mulheres entre setenta e cinquenta anos, pintadas, barulhentas, dissimuladas sob as sedas negras e o azeviche, soluçando às quatro horas da manhã em meio à fumaça dos cigarros, junto ao pequeno lume vermelho dos ícones, quatro mulheres tomando copos de chá, falando uma língua áspera que Jacqueline teria dado a metade de sua vida para esquecer, deixavam-na louca por ter que obedecer-lhes, e até por escutá-las e por vê-las. Quando via sua mãe levar à boca um pedaço de açúcar para tomar seu chá, ela largava seu próprio copo e voltava ao seu covil empoeirado e seco, deixando as três, avó, mãe e irmã de sua mãe, as três morenas com cabelos tingidos, e sobrancelhas espessas, com seus grandes olhos de coça reprovadores, no quarto de sua mãe que servia de sala, com a criada que acabava de assemelhar-se a elas. Fugia e batia a porta ao passar, enquanto chamavam por ela: "Choura, Choura, pombinha", como nos romances de Tolstoi, pois não se chamava Jacqueline. Jacqueline era um nome para sua profissão, um nome para esquecer seu verdadeiro nome, e com ele o gineceu sórdido e terno, um nome para estabelecer-se no mundo francês, um mundo sólido onde existem homens que se casam com você, e que não desaparecem em misteriosas expedições como seu pai que nunca tinha conhecido, marinheiro balta perdido nas neves do pólo. Só com ele se parecia, pensava com raiva e delícia, só com ele, de quem tinha os cabelos e as maças do rosto, assim como a pele trigueira e os olhos amendoados. O único reconhecimento que sentia por sua mãe era o de lhe ter dado por pai este demônio claro que a neve tinha recuperado como a terra recupera os outros homens. Mas tinha-lhe raiva por ela tê-lo esquecido o suficiente para que, um belo dia, de uma relação breve, tivesse nascido uma menina morena, uma meia-irmã declarada de pai desconhecido, que se chamava Natalie, e que tinha agora quinze anos. Só se via Natalie nas férias. Quanto ao seu pai, nunca. Mas pagava a pensão de Natalie num colégio perto de Paris e mandava à mãe de Natalie uma renda da qual viviam mediocremente, num ócio que consideravam um paraíso, as três mulheres e a criada -- e até mesmo Jacqueline até este dia. O que Jacqueline ganhava na sua profissão de manequim, ou como diziam à americana, de modelo, quando não gastava com pinturas, lingerie, sapatos de algum grande sapateiro ou roupas de algum grande costureiro -- a preço de favor, mas que ainda assim ficava muito caro -- era tragado pela bolsa familiar e desaparecia não se sabe em quê. Jacqueline certamente teria podido fazer-se sustentar, e não lhe tinham faltado oportunidades. Aceitara um ou dois, menos porque a agradavam -- não a desagradavam --, do que para provar a si mesma que era capaz de inspirar desejo e amor. O único dos dois que era rico -- o segundo -- tinha lhe dado de presente uma pérola muito bonita, meio rosada, que usava na mão esquerda; mas tinha se recusado a ir morar com ele e, como ele recusava-se a casar, tinha-o deixado sem muito arrependimento, aliviada por não estar grávida (uma vez pensou que estava grávida e viveu alguns dias de pavor). Não, morar com um amante era perder a dignidade, perder suas chances de futuro, fazer o que sua mãe tinha feito com o pai de Natalie; era impossível. Mas com O, tudo mudava. Uma ficção polida permitia que se acreditasse que Jacqueline simplesmente se instalava com uma colega para dividir as despesas. O serviria ao mesmo tempo a dois objetivos: representaria junto a Jacqueline o papel do amante que sustenta ou ajuda a sustentar a moça que ama, e o papel, em princípio oposto, de caução moral. A presença de René não era tão oficial, que a ficção arriscasse ser comprometida. Mas no fundo da decisão de Jacqueline, quem sabe se esta própria presença não tenha sido o verdadeiro motivo de sua aceitação? De qualquer forma, coube a O e só a O, ir fazer a proposta à mãe de Jacqueline. Nunca O tivera o sentimento tão forte de ser o traidor, o espião, o enviado de uma organização criminosa, como quando encontrou-se diante dessa mulher que a agradecia pela amizade que tinha por sua filha.
Ao mesmo tempo, no fundo de seu coração, negava sua missão e o motivo de sua presença. Sim, Jacqueline viria para sua casa mas O não poderia, nunca, obedecer tão bem a Sir Stephen como para entregar-lhe Jacqueline. E no entanto... Pois assim que Jacqueline instalou-se na casa de O, onde recebeu -- a pedido de René -- o quarto que este às vezes fingia ocupar (fingia, porque dormia sempre na grande cama de O), O foi surpreendida, contra toda expectativa, pelo violento desejo de possuir Jacqueline a qualquer preço, mesmo que para consegui-lo tivesse que entregá-la. Afinal de contas, pensava, a beleza de Jacqueline é suficiente para protegê-la, por que tenho que me meter? e se tiver que ser reduzida ao ponto em que me encontro reduzida, será um mal assim tão grande? pensava, mal se confessando, entretanto perturbada ao imaginar a doçura que encontraria em ver Jacqueline nua e sem defesa, junto dela, e como ela.

Na semana em que Jacqueline se instalou, com toda a permissão de sua mãe, René mostrou-se muito solícito, convidando as duas quase todos os dias para jantar e levando-as a ver filmes que curiosamente escolhia entre os filmes policiais, histórias de traficantes de drogas ou de tráfico de brancas. Sentava-se entre as duas, segurando docemente a mão de cada uma, e não dizia nada. Mas O via-o, a cada cena de violência, espreitar alguma emoção no rosto de Jacqueline. Só podia perceber nela um certo aborrecimento, que abaixava os cantos de sua boca. Levava-as depois para casa, e no carro conversível, com os vidros abaixados, o vento da noite e a velocidade espalhavam os cabelos claros e espessos de Jacqueline sobre suas faces duras, sua testa pequena, a até sobre seus olhos. Jacqueline sacudia a cabeça para pô-los no lugar, passando a mão como costumam fazer os rapazes. Uma vez estabelecido que morava com O, e que O era amante de René, pareciam-lhe naturais nesta situação, as familiaridades de René. Admitia sem reclamar que René entrasse em seu quarto com o pretexto de que tinha esquecido ali algum documento, o que não era verdade. O sabia, pois ela própria tinha esvaziado as gavetas da grande secretária holandesa com flores em marchetaria, tampa sempre aberta, forrada de couro e que combinava tão mal com René. Por que a tinha? De quem teria vindo? Sua elegância pesada, suas madeiras claras, eram o único luxo do cômodo um tanto sombrio, que dava para o norte, sobre o pátio, e cujas paredes cinzentas, cor de aço, e o assoalho encerado e frio contrastavam com os cômodos alegres que davam para o cais. Isso era bom, Jacqueline não iria gostar e seria mais fácil que aceitasse compartilhar com O os dois cômodos da frente, e dormir com O, assim como tinha aceitado compartilhar, desde o primeiro dia, o banheiro, a cozinha, as pinturas, os perfumes e as refeições. Mas O se enganava. Jacqueline era apaixonadamente ligada ao que lhe pertencia _ como por exemplo à sua pérola rosa _ mas de uma indiferença absoluta para com o que não lhe pertencia. Morando num palácio, só se interessaria por ele se lhe tivessem dito: o palácio é seu, e que o tivessem provado por um ato registrado em tabelião. Que o quarto cinzento fosse agradável ou não era-lhe igual, e não foi para fugir dele que veio deitar-se na cama de O. Também não foi para provar a O algum reconhecimento que não sentia -- e que, no entanto, O atribuiu-lhe, feliz ao mesmo tempo por abusar disto, como acreditava. Jacqueline amava o prazer, e achava agradável e prático recebê-lo de uma mulher, em cujas mãos não arriscava nada.

Cinco dias depois de ter desfeito as malas, com a ajuda de O, quando pela primeira vez René as trouxe para casa depois de terem jantado, por voltas das dez horas, partiu -- pois foi embora, como das duas outras vezes -- , Jacqueline, nua e ainda molhada do banho, simplesmente apareceu na soleira da porta do quarto de O, dizendo: "Tem certeza de que ele não vai voltar?" e, mesmo sem esperar a resposta, introduziu-se na grande cama. Deixou-se beijar e acariciar com os olhos fechados, sem responder a nenhuma carícia; no começo gemeu um pouco, depois mais forte, depois mais forte ainda e no fim gritou. Adormeceu sob a luz da lâmpada rosa, atravessada na cama, com os joelhos caídos e separados, o busto um pouco de lado, as mãos abertas. Via-se o suor brilhando entre seus seios. O cobriu-a e apagou a luz. Duas horas mais tarde, quando recomeçou, no escuro, Jacqueline deixou-se possuir, mas murmurou: "Não me canse demais, vou levantar cedo amanhã".
Foi nessa época que Jacqueline, além do seu trabalho intermitente de modelo, começou a exercer outra profissão não menos irregular, mas mais absorvente: foi contratada para representar pequenos papéis no cinema. Era difícil saber se estava orgulhosa ou não, se via aí ou não o primeiro passo numa carreira na qual gostaria de tornar-se célebre. Arrancava-se da cama de manhã, com mais raiva do que entusiasmo, tomava uma ducha e se maquilava com pressa, aceitando apenas uma xícara grande de café preto que O mal tinha tido tempo de preparar, e permitia que beijasse a ponta de seus dedos com um sorriso maquinal e um olhar cheio de rancor: O estava doce e quente no seu roupão de vicunha branca, com os cabelos escovados, o rosto lavado, o aspecto de quem ainda vai dormir. No entanto não era verdade. O ainda não ousara explicar a Jacqueline por quê. A verdade era que todos os dias em que Jacqueline partia para o estúdio de Boulogne onde representava, na hora em que as crianças vão para a escola e os empregados para seus escritórios, O, que antes costumava ficar em casa durante toda a manhã, vestia-se por sua vez: "Vou enviar-lhe meu carro", dissera Sir Stephen, "para levar Jacqueline para Boulogne e depois voltar para buscá-la". E assim O passou a ir todas as manhãs à casa de Sir Stephen, no momento em que o sol ainda batia apenas no leste das fachadas; os outros muros estavam frescos, mas nos jardins a sombra se encolhia sob as árvores. Na rua de Poitiers, a limpeza da casa ainda não tinha acabado. A mulata Norah acompanhava O ao quarto onde na primeira noite Sir Stephen tinha-a deixado dormir e chorar sozinha, esperava que O colocasse suas luvas, sua bolsa e suas roupas sobre a cama para pegá-las e guardá-las, diante de O, num armário do qual guardava a chave; depois, entregando-lhe chinelos envernizados de saltos altos que faziam barulho quando caminhava, ia à sua frente, abrindo as portas para que passasse, até a porta do escritório de Sir Stephen, onde se afastava para deixá-la passar. O nunca se acostumou com estes preparativos, e pôr-se nua diante desta velha mulher paciente, que não lhe falava nada e que mal a olhava, parecia-lhe tão temível como ficar nua em Roissy sob os olhares dos criados. Em seus chinelos de feltro, como uma religiosa, a velha mulata deslizava em silêncio. Durante todo o tempo em que a seguia, O não conseguia desviar os olhos das duas pontas de sua touca e de sua mão escura e magra sobre a maçaneta de porcelana cada vez que abria uma porta, uma mão que parecia dura como madeira velha. Ao mesmo tempo, por um sentimento totalmente oposto ao terror que lhe inspirava -- e cuja contradição O não conseguia explicar -- experimentava uma espécie de orgulho no fato de que esta criada de Sir Stephen (o que significava para Sir Stephen? e por que confiava-lhe este papel de preparadora, para o qual parecia tão pouco adequada?) fosse testemunha de que ela também -- como talvez outras trazidas do mesmo modo por ela, quem sabe? -- merecia ser utilizada por Sir Stephen. Pois Sir Stephen provavelmente a amava; sem dúvida a amava, e O sentia que se aproximava o momento em que não mais ia deixá-la apenas perceber, mas dizê-lo claramente. No entanto, na medida em que seu amor e seu desejo por ela aumentavam, tornava-se mais longamente, mais lentamente, mais minuciosamente exigente. Conservada assim ao seu lado todas as manhãs, muitas vezes mal a tomando, querendo apenas ser acariciado por ela. O prestava-se ao que lhe pedia com o que só pode ser chamado de reconhecimento, ainda maior quando o pedido tomava a forma de uma ordem. Cada entrega era garantia de que uma outra entrega seria exigida dela, de cada uma desempenhava-se como de uma dívida; era estranho que se sentisse satisfeita: no entanto, sentia-se. O escritório de Sir Stephen, situado acima da sala amarela e cinza onde costumava ficar à tarde, era mais estreito e com o teto mais baixo. Não tinha sofá nem divã, apenas duas poltronas Regência cobertas de tapeçaria florida. O sentava-se nelas às vezes, mas Sir Stephen geralmente preferia mantê-la mais perto dele, ao alcance de sua mão, e mesmo quando não se ocupava com ela, que ficasse sentada sobre a escrivaninha, à sua esquerda. A escrivaninha encontrava-se perpendicular à parede e O podia encostar-se nas prateleiras que continham alguns dicionários e anuários encadernados. Havia um telefone que ficava junto à sua coxa esquerda, e, cada vez que tocava, ela estremecia. Era ela quem atendia, dizendo: "Da parte de quem?", repetia o nome em voz alta e passava a comunicação para Sir Stephen, ou desculpava-o, dependendo do sinal que este lhe fazia. Quando tinha que receber alguém, a velha Norah vinha anunciar, Sir Stephen fazia esperar o tempo necessário para Norah conduzir O ao quarto onde tinha tirado a roupa, e onde Norah vinha novamente buscá-la quando Sir Stephen mandava chamá-la, já tendo saído a visita. Como Norah entrava e saía do escritório várias vezes todas as manhãs, para levar café ou a correspondência para Sir Stephen, ou para abrir ou fechar as persianas, ou para esvaziar os cinzeiros, e como era a única a ter o direito de entrar, mas tendo ordem também de não bater e, enfim, como sempre que tinha algo a dizer esperava em silêncio que Sir Stephen lhe dirigisse a palavra, aconteceu que uma vez O encontrava-se curvada sobre a escrivaninha, com a cabeça e os braços apoiados sobre o couro e as ancas oferecidas esperando que Sir Stephen a penetrasse, no momento em que Norah entrava. Levantou a cabeça. Se Norah, como de costume, não a tivesse olhado, não teria se movido. Mas, desta vez, era claro que Norah queria encontrar o olhar de O. Estes olhos negros, brilhantes e duros, fixos nos seus, que não sabia se eram ou não indiferentes, num rosto carrancudo e imóvel, perturbaram O de tal maneira, que fez um movimento para escapar de Sir Stephen. Ele compreendeu; com uma mão segurou sua cintura junto à mesa para que não pudesse escorregar, entreabrindo-a com a outra.
Ela, que sempre o recebia o melhor possível, estava contraída e fechada apesar de si mesma e Sir Stephen teve que forçá-la. Mesmo quando o fez, sentia que o orifício de suas nádegas apertava-se, e foi com dificuldade que a penetrou completamente. Só se retirou quando pôde ir e vir nela sem dificuldade. Então, ao recomeçar, disse a Norah para esperar, e que poderia levar O para vestir-se assim que tivesse terminado. Antes de dispensá-la, entretanto, beijou-a na boca com ternura. Foi por este beijo que, dias mais tarde, O teve a coragem de dizer-lhe que Norah lhe dava medo. "Espero que sim", respondeu Sir Stephen. "E quando usar minha marca e meus ferros, como o fará em breve -- se consentir -- terá mais motivos para temê-la" "Por quê? ", disse O "e que marca, que ferros? Já estou usando este anel..." "Isto concerne a Anne-Marie, a quem prometi mostrá-la. Vamos à sua casa depois do almoço. Quer? É uma das minhas amigas, e deve ter observado que até agora nunca lhe apresentei meus amigos. Quando sair de suas mãos, dar-lhe-ei verdadeiros motivos para ter medo de Norah". O não ousou insistir. Esta Anne-Marie com quem a ameaçavam, intrigava-a mais do que Norah. Era dela que Sir Stephen falara quando tinham almoçado em Saint-Cloud. E era bem verdade que O não conhecia nenhum dos amigos, nenhumas das relações de Sir Stephen. Vivia, enfim, em Paris, fechada no seu segredo, como se estivesse fechada num bordel; os únicos que tinham direito ao seu segredo, René e Sir Stephen, tinham, ao mesmo tempo, direito ao seu corpo. Para ela, as palavras abrir-se a alguém, que significa confiar-se, só tinha um sentido literal, físico, e aliás absoluto, pois efetivamente abria-se em todas as partes do seu corpo que fosse possível. Parecia-lhe também que esta era a sua razão de existir e que Sir Stephen e René também pensavam assim, pois quando falavam de seus amigos, como em Saint-Cloud, era para dizer-lhe que obviamente estaria à disposição daqueles a quem a apresentariam, caso a desejassem. Mas para imaginar Anne-Marie, e o que Sir Stephen esperava para ela de Anne-Marie, O não tinha nada que a instruísse, nem mesmo sua experiência em Roissy. Sir Stephen também lhe dissera que queria vê-la acariciar uma mulher, seria isto? (Mas tinha se referido precisamente a Jacqueline...) Não, não era isto. "Mostra-la", tinha acabado de dizer. Com efeito; mas quando deixou Anne-Marie, O não sabia mais do que isso.

Anne-Marie morava perto do Observatório, num apartamento que se comunicava com um grande ateliê, no alto de um prédio novo que dominava o cimo das árvores. Era uma mulher magra, da idade de Sir Stephen, e cujos cabelos negros misturavam-se com mechas cinzas. Seus olhos azuis eram tão escuros que pareciam negros. Ofereceu a Sir Stephen e a O, em pequenas xícaras, um café muito preto, quente e amargo que reconfortou O. Quando terminou de beber e levantou-se de sua poltrona para colocar a xícara vazia sobre a um aparador, Anne-Marie segurou-a pelo pulso e, voltando-se para Sir Stephen, disse-lhe: "Permite-me?" "Por favor", disse Sir Stephen. Então, Anne-Marie, que até agora não lhe dirigira a palavra, nem sorrira quando Sir Stephen tinha lhe apresentado O, disse-lhe docemente, com um sorriso tão terno que parecia estar lhe dando um presente: "Deixe-me ver seu ventre e suas nádegas, menina. Mas será melhor que fique nua.". Enquanto O obedecia, Anne-Marie acendia um cigarro. Sir Stephen não desviara os olhos de O. Deixaram-na de pé por cerca de cinco minutos. Não havia espelho na peça, mas O percebia vagamente seu reflexo na laca negra de um paravento. "Tire também suas meias", disse Anne-Marie repentinamente. "Veja", continuou, "não deve usar ligas, vão deformar suas coxas". E mostrou, com a ponta do dedo, o ligeiro sulco que marcava, acima do joelho, o lugar onde O enrolava sua meia em volta da larga liga elástica. "Quem a fez fazer isto?" E antes que O tivesse respondido: "Foi o rapaz por quem me foi dada" disse Sir Stephen, "René, você o conhece". E acrescentou: "Mas certamente concordará com sua opinião" . "Bom", disse Anne-Marie, "vou lhe dar meias longas e escuras, O, e uma cinta-liga para segurá-las, mas uma cinta-liga com barbatanas, que marque sua cintura". Quando Anne-Marie tocou a sineta, uma jovem loura e silenciosa trouxe meias pretas muito finas e uma cinta-liga em tafetá de náilon negro, mantida esticada por longas barbatanas bem juntas e curvas, que achatavam o ventre e a cintura. O, sempre de pé, equilibrando-se em um pé e no outro, vestiu as meias que subiam até o alto de suas coxas. A jovem loura vestiu-lhe a cinta, que se abotoava na cintura, de um lado das costas. Também nas costas, como nos espartilhos de Roissy, um longo cordel permitia que se apertasse ou se alargasse à vontade. O prendeu suas meias na frente e dos lados nas quatro ligas e, em seguida, a jovem encarregou-se de apertar os laços o mais estreitamente possível. O sentiu sua cintura e o seu ventre afundarem sob a pressão das barbatanas, que desciam pelo ventre até o púbis, que os deixavam livres, assim como os quadris. A cinta era mais curta atrás, deixando as nádegas totalmente livres. "Ficará muito melhor", disse Anne-Marie dirigindo-se a Sir Stephen, "quando tiver a cintura totalmente reduzida; além disso, se não tiver tempo para tirar sua roupa, verá que a cinta não atrapalha. Aproxime-se agora, O" A moça saiu, e O aproximou-se de Anne-Marie, que estava sentada numa poltrona baixa _ uma poltrona baixa forrada de veludo cor de cereja. Anne-Marie passou a mão com suavidade sobre seus quadris, em seguida, derrubando-a sobre um pufe semelhante ao sofá, levantou e abriu suas pernas, ordenando-lhe que não se mexesse, segurou os lábios de seu ventre. Assim se expõem as guelras dos peixes no mercado e os beiços dos cavalos nas feiras campestres, pensou O. Lembrou-se que o criado Pierre tinha feito a mesma coisa na primeira noite de Roissy, depois de acorrentá-la. Afinal, não se pertencia mais e o que nela pertencia-lhe ainda menos era, certamente, esta metade de seu corpo que podia servir tão bem, por assim dizer excluindo-a. Por que, todas as vezes em que constatava isto, ficava, não surpresa, mas como persuadida novamente, com a mesma perturbação igualmente forte que a imobilizava e que a entregava muito menos àquele em cujas mãos se encontrava do que àquele que a tinha entregado entre as mãos estranhas? Em Roissy, quando a possuíam entregava-se a René; e aqui a quem? A René ou a Sir Stephen? Ah, não sabia mais; mas porque não queria mais saber, pois realmente era a Sir Stephen que pertencia; desde quando?.... Anne-Marie fez com que ficasse de pé e se vestisse. "Pode trazê-la quando quiser", disse a Sir Stephen, "estarei em Samois (Samois... O esperava Roissy; pois bem, não, não se tratava de Roissy ; então de que se tratava?) dentro de dois dias. Vai ficar muito bem." (O que iria ficar bem?) "Daqui a dez dias se quiser", respondeu Sir Stephen, "no começo de julho."

No carro que a levou de volta para casa, Sir Stephen tendo ficado com Anne-Marie, O lembrou-se da estátua que vira quando criança no Luxembourg: uma mulher cuja cintura tinha sido tão apertada e parecia tão fina entre os seios pesados e as nádegas carnudas _ estava inclinada para a frente para olhar-se numa fonte, também em mármore, tão cuidadosamente representada aos seus pés _ que dava medo de que o mármore se quebrasse. Se Sir Stephen o desejava ... Quanto à Jacqueline, seria fácil dizer-lhe que era um capricho de René. A este respeito, O sentiu novamente a preocupação da qual tentava fugir sempre que voltava para casa, admirando-se, entretanto, de que não fosse mais lancinante: por que, desde que Jacqueline se mudara para lá, René tomava o cuidado, não tanto de deixá-la a sós com Jacqueline, o que se compreendia, mas também de não ficar mais a sós com O? Aproximava-se julho, quando deveria partir e certamente não iria vê-la na casa desta Anne-Marie para onde Sir Stephen a mandaria, e seria preciso então resignar-se a encontrá-lo apenas à noite quando lhe agradava convidar a ela e a Jacqueline -- e já não sabia o que era agora mais desconcertante (pois só existiam entre eles estas relações essencialmente falsas por serem assim limitadas) -- ou então de manhã, algumas vezes, quando se encontrava na casa de Sir Stephen e Norah o introduzia depois de tê-lo anunciado? Sir Stephen sempre o recebia, sempre beijava O, acariciava o bico de seus seios, fazia com Sir Stephen projetos para o futuro onde não se tratava dela, e ia embora. Tinha-a dado a Sir Stephen de tal forma que não mais a amava? O foi tomada de um pânico tão grande, que desceu automaticamente no cais diante de sua casa e, em vez de conservar o carro, começou a correr imediatamente à procura de um táxi. É difícil encontrar táxis no cais de Béthune. O correu até o boulevard Saint-Germain e ainda teve que esperar.

Estava suando e sem fôlego, pois a cinta cortava a sua respiração, quando finalmente um táxi diminuiu a velocidade na esquina da rua do Cardinal Lemoine. Fez-lhe sinal, deu o endereço do escritório onde René trabalhava e subiu, sem saber se René estaria e, se estivesse, se a receberia. Nunca tinha ido lá. Não se surpreendeu com o grande prédio numa rua perpendicular aos Champs-Elysées, nem com os escritórios à americana, mas a atitude de René, que, no entanto, recebeu-a imediatamente, a desconcertou. Não que fosse agressivo ou cheio de recriminações; teria preferido que a recriminasse, pois afinal não lhe tinha permitido vir incomodá-lo, e talvez o estivesse incomodando muito. Mandou sua secretária sair, pedindo-lhe para não anunciar ninguém e não lhe passar nenhum telefonema. Depois, perguntou a O o que estava acontecendo. "Tive medo de que não me amasse mais", disse O.

Ele riu: "Assim, de repente?" "Sim, no carro, quando voltava de...", René riu mais ainda: "Mas eu sei, como é boba. Da casa de Anne-Marie. E vai para Samois daqui a dez dias. Sir Stephen acaba de me telefonar". René estava sentado na única poltrona confortável do seu escritório, diante da mesa, e O tinha se encolhido em seus braços. "O que farão comigo me é indiferente", murmurou, "mas diga-me se me ama ainda". "Meu coraçãozinho, eu a amo", disse René, "mas quero que me obedeça, e você me obedece muito mal. Contou a Jacqueline que pertencia a Sir Stephen, falou-lhe de Roissy?" O disse que não. Jacqueline aceitava suas carícias, mas no momento em que soubesse que O... René não a deixou acabar, recostou-se na poltrona que acabava de deixar e levantou sua saia: "Ah! essa é a cinta", disse. "É verdade que ficará muito mais agradável quando tiver a cintura bem estreita". Em seguida, possuiu-a e O percebeu que há tanto tempo não a possuía, que no fundo duvidara até de que ainda tivesse algum desejo por ela, e viu nisso, ingenuamente, uma prova de amor. "Sabe", disse-lhe em seguida, "está sendo tola em não falar com Jacqueline. Precisamos dela em Roissy, seria mais cômodo que fosse você quem a levasse. Além disso, quando voltar da casa de Anne-Marie, não poderá mais lhe esconder sua verdadeira condição." O perguntou por quê. "Você vai saber", continuou René. "Tem ainda cinco dias, e somente cinco dias, pois Sir Stephen pretende, cinco dias antes de enviá-la para Anne-Marie, recomeçar a chicoteá-la todos os dias; certamente ficará com marcas, como vai explicá-las a Jacqueline?" O não respondeu. O que René não sabia era que Jacqueline não se interessava por O a não ser pela paixão que O lhe devotava, e que nunca a olhava. Mesmo que estivesse coberta de cicatrizes de chicote, bastava que tivesse o cuidado de não tomar banho na frente de Jacqueline, de vestir uma camisola e Jacqueline nada veria. Não tinha observado que O não usava calcinhas, não observava nada: O não a interessava. "Escute", continuou René, "em todo o caso tem uma coisa que deve dizer-lhe imediatamente: é que estou apaixonado por ela." "E isso é verdade?" perguntou O. "Quero tê-la", disse René, "e como você não pode ou não quer fazer nada, farei o que for necessário" "Quanto a Roissy, não vai querer nunca", disse O. "Ah, não? Pois bem", disse René, "vamos obrigá-la".

Já era tarde da noite, quando Jacqueline se deitou e O puxou o lençol para olhá-la à luz da lâmpada, depois de ter lhe dito: "René está apaixonado por você", pois disse-o, e o disse imediatamente; O, que à ideia de ver este corpo tão frágil e tão delgado esfolado pelo chicote, este ventre estreito esquartejado, a boca pura uivante e a penugem das faces colada pelas lágrimas, tinha ficado transtornada de horror um mês antes, repetiu para si mesma as últimas palavras de René e sentiu-se feliz com isto.

Jacqueline tendo partido, certamente para voltar só no começo de agosto se o filme que rodava tivesse acabado, nada mais retinha O em Paris. Julho se aproximava, todos os jardins explodiam em gerânios vermelhos, todas as cortinas estavam abaixadas ao meio-dia e René suspirava por ter que ir para a Escócia. O teve, por um instante, a esperança de que a levaria. Mas, além de nunca levá-la à sua família, sabia que a cederia a Sir Stephen se esta a reclamasse. Sir Stephen declarou que no dia em que René tomasse o avião para Londres, viria buscá-la. O estava de férias. "Vamos para a casa de Anne- Marie", disse: "ela a espera. Não leve nenhuma mala, não terá necessidade de nada". Não foram para o apartamento do Observatório onde, pela primeira vez, O tinha encontrado Anne-Marie, mas para uma casa baixa, no fundo de um grande jardim, nos limites da floresta de Fontainebleau. Desde aquele dia O usava a cinta com barbatanas que Anne- Marie considerava tão necessária. Todos os dias apertava-a mais, já se podia, quase, segurar sua cintura entre as duas mãos, Anne- Marie ficaria contente. Quando chegaram, eram duas horas da tarde, a casa dormia, e o cão latiu debilmente ao toque de campainha: era um grande pastor de Flandres com pelo crespo que cheirou os joelhos de O sob o vestido. Anne-Marie encontrava-se debaixo de uma faia púrpura, no fim do gramado, que ficava na frente das janelas do seu quarto, num canto do jardim. Não se levantou. "Aqui está O", disse Sir Stephen, "você sabe o que tem a fazer; quando estará pronta?" Anne-Marie olhou O. "Não a preveniu? Pois bem, começarei imediatamente. É preciso contar dez dias seguidos, sem dúvida. Suponho que vai querer colocar pessoalmente os anéis e a marca. Volte em quinze dias. E depois de mais quinze dias, tudo deverá ter acabado." O quis falar, fazer uma pergunta. "Um momento, O", disse Anne-Marie "vá para o quarto da frente, tire sua roupa ficando só com as sandálias, e volte". O quarto estava vazio, um grande quarto branco, com cortinas em tecido violeta. O colocou sua bolsa, suas luvas e suas roupas sobre uma pequena cadeira perto de uma porta de armário. Não havia espelho. Saiu lentamente, ofuscada pelo sol, até alcançar a sombra da faia. Sir Stephen continuava de pé diante de Anne-Marie, com o cão aos seus pés. Os cabelos negros e cinzas de Anne-Marie brilhavam como se estivessem com óleo, seus olhos azuis pareciam negros. Estava vestida de branco, com um cinto envernizado à cintura e usava sandálias de verniz que permitiam ver o esmalte vermelho das unhas nos pés nus, igual ao esmalte vermelho das unhas das mãos. "O", disse, "fique de joelhos na frente de Sir Stephen". O ajoelhou-se, com os braços cruzados atrás das costas e os bicos dos seios trêmulos. O cachorro ameaçou lançar-se sobre ela. "Aqui, Turco", chamou Anne-Marie "O, consente em usar os anéis e o sinal com os quais Sir Stephen deseja que seja marcada, sem saber como lhe serão impostos?" "Sim", disse O. "Vou acompanhar Sir Stephen, então; fique aí". Sir Stephen inclinou-se e segurou os seios de O enquanto Anne-Marie levantava-se de sua cadeira preguiçosa. Ainda beijou sua boca e murmurou: "Você é minha, O, é realmente minha?", depois deixou-a para seguir Anne-Marie. O portão bateu, Anne-Marie voltava. O, com os joelhos dobrados, tinha se sentado sobre os calcanhares e colocado os braços sobre os joelhos como uma estátua do Egito.

Na casa moravam ainda três moças, cada uma tendo um quarto no primeiro andar; deram a O um pequeno quarto no térreo, vizinho ao de Anne-Marie. Anne-Marie chamou-as, gritando que descessem para o jardim. As três estavam nuas como O. Neste gineceu, cuidadosamente escondido pelos altos muros do parque e com as venezianas fechadas sobre uma ruela de terra, só estavam vestidas Anne-Marie e as criadas: uma cozinheira e duas arrumadeiras, mais velhas do que Anne-Marie, severas em suas grandes saias de alpaca negra e em seus aventais engomados. "Chama-se O", disse Anne-Marie, que novamente tinha-se sentado. "Tragam-na para perto, para que eu a veja melhor". Duas das moças puseram O de pé, ambas morenas, com os cabelos tão negros quanto os pelos, os bicos dos seios longos e quase violetas. A terceira era pequena, roliça e ruiva, e sobre a pele clara de seu peito via-se uma impressionante rede de veios esverdeados. As duas moças conduziram O para perto de Anne-Marie, que mostrou com o dedo as três riscas negras que marcavam a frente das suas coxas, e que se repetiam nos quadris. "Quem a chicoteou foi Sir Stephen?", perguntou. "Sim", disse O, "Com o quê e quando?" "Há três dias, com a chibata." "Durante um mês, a partir de amanhã não será mais chicoteada, mas o será hoje, para sua chegada, quando tiver acabado de examiná-la. Sir Stephen nunca chicoteou o interior de suas coxas, com as pernas totalmente abertas? Não? Não, os homens não sabem. Logo mais veremos. Mostre sua cintura. Ah! Está melhor!" Anne-Marie apertava a cintura estreita de O, para fazê-la ainda mais estreita. Depois enviou a pequena ruiva buscar uma outra cinta e mandou que a colocassem. Também era de náilon preto, tão justa e com barbatanas tão duras que parecia um cinto de couro muito alto; não comportava ligas. Uma das moças morenas laçava-a, enquanto Anne-Marie ordenava que apertasse com toda a força. "É terrível", disse O. "Justamente", disse Anne-Marie, "é por isso que está muito mais bonita; mas não apertava o suficiente, agora vai usá-la assim todos os dias. Diga-me agora como Sir Stephen preferia servir-se de você. Preciso saber". Segurava O com a mão toda dentro de seu ventre e O não conseguia responder. Duas das moças tinham-se sentado no chão e a terceira, uma morena, na ponta da cadeira de Anne-Marie. "Virem-na, vocês duas", disse Anne-Marie, "quero ver seus quadris". O foi virada e derrubada e as mãos das duas moças entreabriram suas nádegas. "É claro", continuou Anne-Marie, "não precisa responder, é nas nádegas que se tem que marcá-la. Levante-se. Vamos colocar seus braceletes. Colette, vai buscar a caixa, vamos tirar a sorte para decidir quem vai chicoteá-la; traga os dados, Colette, depois iremos à sala de música." Colette era a mais alta das duas moças morenas, a outra chamava-se Claire, e a pequena ruiva Yvone. O não tinha reparado que todas usavam, como em Roissy, um colar de couro e braceletes nos pulsos. Além disso, usavam nos tornozelos os mesmos braceletes. Quando Yvone escolheu e fixou em O os braceletes que lhe serviam, Anne-Marie estendeu a O quatro dados, pedindo-lhe que os distribuísse, sem olhar o número inscrito. O distribuiu seus dados. As três moças olhavam, cada uma o seu, e não disseram nada, esperando que Anne-Marie falasse. "Tenho dois", disse Anne-Marie, "quem tem um?" Era Colette. "Leve O, ela é sua" Colette segurou os braços de O e juntando suas mãos atrás das costas, prendeu-as com os braceletes, empurrando-a para a frente. À soleira de uma porta-janela que se abria para um pequena ala perpendicular à fachada principal, Yvone, que as precedia, retirou as sandálias de O. A porta-janela iluminava uma peça cujo fundo formava uma espécie de rotunda mais elevada; o teto em cúpula apenas sugerida era mantida, no começo da curva, por duas colunas estreitas com uma separação de dois metros. O estrado, quatro degraus acima, prolongava-se, entre as duas colunas, por um tablado arredondado. O chão da rotunda, assim como do resto da peça, era coberto por um tapete de feltro vermelho. As paredes eram brancas, as cortinas das janelas vermelhas e os divãs que acompanhavam o círculo da rotunda, de feltro vermelho como o tapete. Havia uma lareira na parte retangular da sala, mais larga do que profunda, na frente da lareira, um grande aparelho de rádio com eletrola, ladeado por estantes de discos. Era por isso que a chamavam a sala de música. Comunicava-se por uma porta, diretamente, com o quarto de Anne-Marie. A porta, simétrica, era uma porta de armário. Além dos divãs e do aparelho de som, não havia nenhum móvel. Enquanto Colette fazia O sentar-se na borda do estrado, que não tinha degraus no meio, os degraus encontrando-se à direita e à esquerda das colunas, as duas outras moças fechavam a porta-janela, após terem fechado as persianas ligeiramente. O percebeu, surpresa, que era uma janela dupla e Anne-Marie, que ria, disse: "É para que não a escutem gritar; as paredes são forradas de cortiça, não se ouve nada do que acontece aqui. Deite-se". Segurou-a pelos ombros, colocou-a sobre o feltro vermelho e, depois, puxou-a um pouco para frente; as mãos de O agarravam-se na borda do estrado, onde Yvone amarrou-as a uma argola, ficando seus quadris no vazio. Anne-Marie fez com que dobrasse os joelhos no peito e, em seguida, O sentiu que suas pernas, assim dobradas, eram repentinamente esticadas e puxadas na mesma direção: foram amarradas mais alto que sua cabeça por correias que passavam pelos braceletes de seus tornozelos, às colunas entre as quais, assim elevada nesse estrado, encontrava-se exposta de tal maneira que a única coisa que dela era visível era a fenda de seu ventre e de suas nádegas, violentamente escancaradas. Anne-Marie acariciou o interior de suas coxas. "Este lugar do corpo é onde a pele é mais delicada", disse, "não se deve estraga-la. Vai suavemente, Colette" Colette estava de pé acima dela com um pé de cada lado da sua cintura e O via, através da ponte que formavam suas pernas morenas, as tiras do chicote que tinha na mão. Aos primeiros golpes que a queimaram sob o ventre, O gemeu. Colette passava da esquerda para a direita, parava, recomeçava. O debatia-se com todo o seu poder, parecia que as correias a rasgavam. Não queria suplicar, não queria pedir misericórdia. Mas Anne-Marie tinha resolvido levá-la até este ponto. "Mais rápido e mais forte", disse a Colette. O obstinou-se, mas foi em vão. Um minuto mais tarde cedia aos gritos e às lágrimas, enquanto Anne-Marie acariciava seu rosto. "Mais um instante", disse, "e depois acabou Cinco minutos apenas. São vinte e cinco. Colette, pare aos trinta, quando lhe disser". Mas O berrava; não, por piedade, não, não podia mais, não, não podia nem mais um segundo suportar o suplício. Teve que sofrê-lo, no entanto, até o fim, e Anne-Marie sorriu-lhe quando Colette deixou o estrado. "Agradeça-me", disse Anne-Marie, e O agradeceu-lhe. Sabia porque Anne-Marie fizera questão de mandar chicoteá-la antes de qualquer coisa. Que uma mulher fosse igualmente cruel e mais implacável do que um homem, nunca tinha duvidado. Mas O acreditava que Anne-Marie procurava menos manifestar o seu poder, do que estabelecer entre ela e O uma cumplicidade. O nunca tinha compreendido, mas tinha acabado por reconhecer, como uma verdade indiscutível e importante, a confusão contraditória e constante de seus sentimentos: amava a ideia do suplício, quando o sofria por ter traído o mundo inteiro para escapar e quando tinha terminado sentia-se feliz por tê-lo sofrido, tanto mais feliz quanto mais cruel e mais longo tivesse sido. Anne-Marie não tinha se enganado nem quanto ao consentimento nem quanto à revolta de O, e bem sabia que seu agradecimento não era irrisório. Havia, entretanto, para seu gesto uma terceira razão, que lhe explicou. Queria fazer com que cada moça que entrava em sua casa e que devia morar aí, num universo unicamente feminino, percebesse que sua condição de mulher não perderia sua importância pelo fato de que só teria contato com outras mulheres, mas que, ao contrário, tornar-se-ia ainda mais presente e mais aguda. Era por esta razão que exigia que as moças estivessem constantemente nuas; o modo como O tinha sido chicoteada, assim como a postura em que tinha sido amarrada, não tinham outra finalidade. Hoje, era O que permaneceria o resto da tarde _ três horas ainda _ com as pernas abertas e levantadas, expostas sobre o estrado, diante do jardim.

Amanhã, seria Claire, Colette ou Yvone que O, por sua vez, olharia. Era um procedimento demasiado lento e demasiado minucioso (assim como a maneira de aplicar o chicote) para que fosse empregado em Roissy, mas O veria como era eficaz. Além dos anéis e da marca que usaria ao partir, seria entregue a Sir Stephen mais aberta e mais profundamente escrava do que imaginava que seria possível.

No dia seguinte, logo após o café da manhã, Anne-Marie disse a O e a Yvone para acompanhá-la ao seu quarto. Pegou em sua secretária um pequeno cofre de couro verde que colocou sobre a cama e abriu. As duas moças sentaram-se aos seus pés. "Yvone não lhe disse nada?" , perguntou Anne-Marie a O. O fez que não com a cabeça. O que teria Yvone para lhe dizer? "Sei que Sir Stephen também não. Pois bem, estes são os anéis que quer que use." Eram anéis de ferro fosco inoxidável, como o ferro de seu anel folheado a ouro. Suas hastes eram redondas, grossas como um lápis de cor, e eram oblongos, semelhantes às malhas das correntes grossas. Anne-Marie mostrou a O que cada um era formado de dois Us que se encaixavam um no outro. "Este é apenas o modelo de prova", disse. "Pode-se retirá-lo. Quanto ao modelo definitivo, veja, tem uma mola interna que deve ser forçada para fazê-lo penetrar no sulco, onde se bloqueia. Uma vez colocado é impossível retirá-lo, seria necessário limar." Cada anel tinha a largura de duas falanges do dedo mínimo que se podia passar por ele. Em cada um, como uma outra malha, ou como um aro na base de um brinco, que deve estar no mesmo plano da orelha e prolongá-la, estava suspenso um disco do mesmo metal, tão grande quanto fosse longo o aro; num dos lados havia um triskel gravado em ouro, e no outro, nada. "No outro lado", disse Anne-Marie, "vai ser gravado o seu nome, seu título e o nome e prenome de Sir Stephen; mais abaixo, um chicote e uma chibata entrecruzados. Yvone usa um disco análogo no seu colar. Mas você deverá usá-lo sob o ventre" "Mas...", disse O. "Eu sei", respondeu Anne-Marie, "foi por isso que trouxe Yvone. Mostre o ventre, Yvone" A moça ruiva se levantou e deitou-se na cama. Anne-Marie abriu suas coxas e mostrou a O que um dos lóbulos de sua vagina encontrava-se furado no meio e na base, como por um bisturi. O anel de ferro passaria justo por aí. "Vou furá-la dentro de um momento, O", disse Anne-Marie, "não é nada, o que demora mais é colocar os aros para juntar a epiderme de cima com a mucosa de baixo. É muito menos duro que o chicote" "Mas não vai me anestesiar?", exclamou O tremendo. "Nunca", respondeu Anne-Marie, "apenas será amarrada um pouco mais forte do que ontem; isso é mais do que suficiente. Venha".

Oito dias mais tarde Anne-Marie retirava os aros de O e passava-lhe o anel de prova. Por mais leve que fosse -- mais do que parecia, pois era oco -- pesava. O duro metal, que se podia ver claramente que entrava na carne, parecia um instrumento de suplício. Como seria quando se acrescentasse a ele o segundo anel, mais pesado? Este aparelho bárbaro se revelaria ao primeiro olhar. "É claro", disse Anne-Marie, quando O fez esta observação. "Afinal compreendeu bem o que Sir Stephen quer? Qualquer um, em Roissy ou em qualquer outro lugar, ele mesmo ou qualquer outro, e até você mesma diante do espelho, qualquer um que levante sua saia verá imediatamente os seus anéis sob seu ventre e, se virar de costas, a marca sobre suas nádegas. Poderá um dia mandar limar os anéis, mas a marca, nunca a apagará" "Achava que se podia apagar muito bem as tatuagens", disse Colette. (Era ela quem tinha tatuado, sobre a pele branca de Yvone, acima do triângulo do ventre, em letras azuis ornadas como as letras de um bordado, as iniciais do senhor de Yvone.) "O não será tatuada", respondeu Anne-Marie. O olhou para Anne-Marie. Colette e Yvone calaram-se embaraçadas.
Anne-Marie hesitava em falar. "Vamos, diga", disse O. "Minha pobre criança, não ousava contar-lhe isto: será marcada com ferro. Sir Stephen mandou-os há dois dias" "Com ferro?", gritou Yvone. "Com ferro em brasa".

Desde o primeiro dia, O tinha compartilhado da vida da casa. O ócio era aí absoluto e deliberado, as distrações monótonas. As moças tinham liberdade para passear no jardim, ler, desenhar, jogar ou ler a sorte no baralho. Podiam dormir em seus quartos, ou deitar ao sol para se bronzear. Às vezes conversavam em grupo, ou duas a duas, por horas, às vezes ficavam sentadas sem dizer nada, aos pés de Anne-Marie. As horas das refeições eram sempre iguais, o jantar era à luz de velas, o chá se tomava no jardim e havia algo de absurdo na naturalidade das duas criadas servindo estas moças nuas, sentadas numa mesa de gala. À noite, Anne-Marie escolhia alguém para ir dormir com ela, às vezes a mesma moça durante várias noites seguidas. Acariciava-a e fazia-se acariciar por ela, em geral de madrugada, e em seguida dormia novamente, depois de tê-la mandado de volta ao seu quarto. As cortinas violetas, semicerradas, coloriam de malva o dia nascente, e Yvone dizia que Anne-Marie era tão bela e altiva no prazer que recebia, como incansável em suas exigências. Nenhuma delas tinha-a visto completamente nua. Abria ou levantava sua camisola branca de jérsei de náilon, mas não a tirava. Nem o prazer que pudesse ter tido à noite nem a escolha que tivesse feito na véspera, influenciavam a decisão do dia seguinte à tarde, que era sempre entregue à sorte. Às três horas, sob a faia púrpura onde as poltronas do jardim estavam agrupadas em volta de uma mesa redonda de pedra branca, Anne-Marie trazia o copo dos dados. Cada uma pegava o seu. Aquela que tirasse o número menor era então conduzida à sala de música e colocada sobre o estrado como O tinha sido. Restava-lhe ( menos O que se encontrava fora de questão até sua partida) indicar a mão direita ou a mão esquerda de Anne-Marie, que segurava ao acaso uma bola branca ou preta. Se fosse preta, a moça era chicoteada, se fosse branca, não. Anne-Marie nunca trapaceava, mesmo se a sorte condenasse ou poupasse a mesma moça durante vários dias. O suplício da pequena Yvone, que soluçava e chamava seu amante, foi assim renovado por quatro dias. Suas coxas, riscadas de verde como seu peito, abriam-se sobre uma carne rosa que o grosso anel de ferro, finalmente colocado, trespassava, de forma ainda mais impressionante pois Yvone estava totalmente depilada. "Mas por quê?", perguntou O a Yvone, "e por que o anel, se usa o disco no colar?" "Ele diz que fico mais nua quando estou depilada. O anel, acho que é para me prender". Os olhos verdes de Yvone e seu pequeno rosto triangular faziam com que O pensasse em Jacqueline sempre que a olhava. E se Jacqueline fosse a Roissy? Um dia ou outro Jacqueline passaria por aqui, estaria aqui, derrubada neste estrado.

"Não quero", dizia O, "não quero, não farei nada para trazê-la, já disse isto mais de uma vez. Jacqueline não foi feita para ser espancada e marcada." Mas como os golpes e os ferros combinavam com Yvone, como seu suor e seus gemidos eram doces, como era doce arrancá-los! Pois Anne-Marie, por duas vezes e até agora só para Yvone, tinha entregado o chicote de cordas a O, dizendo-lhe para bater. Na primeira vez, no primeiro minuto, tinha hesitado, ao primeiro grito de Yvone tinha recuado, mas assim que recomeçou e Yvone gritou novamente, mais forte, sentiu que ria de alegria apesar de si mesma, e que tinha que controlar-se para diminuir seus golpes e não bater com toda a força. Depois, tinha ficado perto de Yvone durante todo o tempo em que ela ficara amarrada, beijando-a de tempos em tempos. Sem dúvida, parecia-se de alguma forma com ela. Pelo menos o sentimento de Anne-Marie parecia provar isso. Seria o silêncio de O, sua docilidade que a seduziam? Mal tinham cicatrizado os ferimentos de O, e Anne-Marie dizia: "Como eu sinto não poder mandar chicoteá-la. Quando voltar... Enfim, em todo o caso vou abri-la todos os dias" E todos os dias, quando a moça que estava na sala de música era desamarrada, O a substituía até a hora do jantar. E Anne-Marie tinha razão: era verdade que durante essas duas horas não podia pensar em nada além do fato de que estava aberta, assim como no anel que pesava em seu ventre desde que o puseram, e que pesou muito mais logo que lhe foi acrescentado um segundo anel. Em nada mais pensava, do que em sua escravidão, a nas marcas da sua escravidão. Uma tarde, Claire tinha entrado com Colette, vindo do jardim, e aproximando-se de O tinha virado seus anéis. Ainda não havia inscrição. "Quando entrou em Roissy", disse, "foi Anne-Marie quem a fez entrar?" "Não", disse O "Quanto a mim, foi Anne-Marie, há dois anos. Vou voltar lá depois de amanhã." "Mas não pertence a ninguém?", disse O. "Claire pertence a mim", disse Anne-Marie que chegava inesperadamente. "O seu senhor chega amanhã de manhã, O. Esta noite quero que venha dormir comigo" A curta noite de verão clareava lentamente e por volta das quatro horas da manhã o dia afogava as últimas estrelas. O, que dormia com os joelhos juntos, foi tirada do sono pela mão de Anne-Marie entre suas coxas. Mas Anne-Marie queria apenas acordá-la para que a acariciasse. Seus olhos brilhavam na penumbra e seus cabelos cinzas, mesclados de fios negros, cortados curtos e levantados pelo travesseiro, davam-lhe um aspecto de grande senhor exilado, de libertino corajoso. O roçou com os lábios o duro bico de seus seios, com sua mão penetrou no fundo do ventre. Anne-Marie entregou-se rapidamente -- mas não era para O. O prazer que fazia seus olhos se abrirem diante do dia, era um prazer anônimo e impessoal do qual O não era mais que o instrumento. Era indiferente a Anne-Marie que O admirasse seu rosto alisado e rejuvenescido, sua bela boca arquejante, era-lhe indiferente que O a escutasse gemer quando tomou entre seus dentes e seus lábios a aresta de carne escondida no sulco de seu ventre. Apenas segurou O pelos cabelos para puxá-la para si mais fortemente, e só a deixou afastar-se para lhe dizer: "Recomece" O tinha amado Jacqueline do mesmo modo. Tinha-a segurado em seus braços, entregue. Tinha-a possuído, ou pelo menos acreditava que sim. Mas a identidade dos gestos nada significa. O não possuía Anne-Marie. Ninguém possuía Anne-Marie. Anne-Marie exigia as carícias sem preocupar-se com o que sentia quem as dava, e entregava-se com uma liberdade insolente. No entanto, foi terna e doce com O, beijou-lhe a boca e os seios, e manteve-a junto de si por uma hora ainda antes de dispensá-la. Tinha retirado seus ferros. "São as últimas horas em que vai dormir sem usar ferros", tinha-lhe dito "Os que vão ser colocados logo mais não poderão ser retirados" Passara sua mão doce e detidamente sobre as nádegas de O, depois levara-a ao cômodo em que se vestia, único da casa onde havia um espelho de três faces, sempre fechado. Abrira o espelho para que O pudesse ver-se. "É a última vez que você se vê intacta", disse-lhe. "É bem aqui, onde é tão redonda e lisa, que serão impressas as iniciais de Sir Stephen, de um lado e do outro do sulco de suas nádegas. Quando for conduzi-la diante do espelho, na véspera de sua partida, não se reconhecerá mais. Mas Sir Stephen tem razão. Vai dormir, O" Entretanto, a angústia manteve O acordada, e quando Colette veio buscá-la, às dez horas, teve que ajudá-la a se banhar, a se pentear, e a maquilar seus lábios, pois O tremia com todos os seus membros; tinha ouvido o portão se abrir: Sir Stephen estava lá. "Vamos, venha O", disse Yvone, "ele a espera".        O sol já brilhava alto no céu, nenhuma brisa movia as folhas da faia: parecia uma árvore de couro. O cão estava deitado ao pé da árvore, derrubado pelo calor e, como o sol ainda não chegara atrás do tronco principal da faia, atravessava a extremidade do galho, que era o único a fazer sombra sobre a mesa neste momento: a pedra estava salpicada de manchas claras e quentes. Sir Stephen estava de pé, imóvel, ao lado da mesa, Anne-Marie sentada ao seu lado. "Veja", disse Anne-Marie quando Yvone trouxe O diante dele, "os anéis podem ser colocados quando quiser, ela já está furada". Sem responder, Sir Stephen tomou O nos braços, beijou-a na boca e, levantando-a completamente, deitou-a sobre a mesa, inclinando-se sobre ela. Em seguida beijou-a mais uma vez, acariciou seu rosto e seus cabelos e, levantando-se, disse a Anne-Marie: "Imediatamente, se quiser". Anne-Marie pegou sobre uma poltrona o cofrezinho de couro que tinha trazido e mostrou para Sir Stephen os anéis separados que continham o nome de O e o seu. "Coloque-os", disse Sir Stephen. Yvone levantou os joelhos de O, e O sentiu o frio do metal que Anne-Marie introduziu na sua carne. No momento de encaixar a segunda parte do anel na primeira, Anne-Marie tomou cuidado para que o lado folheado a ouro ficasse virado para fora, junto à coxa, e o lado que continha a inscrição, para o interior. Mas a mola era tão dura que as hastes não entravam profundamente. Foi necessário mandar Yvone buscar um martelo. Levantaram O, inclinando-a com as pernas abertas na borda da lousa de pedra que servia como bigorna, tanto para apoiar a extremidade dos dois aros, como para fixá-los. Sir Stephen olhava sem dizer nada. Quando tudo terminou, agradeceu a Anne-Marie e ajudou O a ficar de pé. O percebeu então que os novos ferros eram muito mais pesados do que os que tinha usado provisoriamente nos dias anteriores. Mas estes eram definitivos. "Suas iniciais agora, não é?", disse Anne-Marie a Sir Stephen. Sir Stephen concordou com um sinal de cabeça, segurando pela cintura O, que cambaleava; não estava usando sua cinta negra, mas esta a tinha modelado tão bem que parecia que ia quebrar-se, de tão delgada. Seus quadris tinham se tornado mais redondos e seus seios mais pesados. Acompanhando Anne-Marie e Yvone, Sir Stephen praticamente carregava O para a sala de música, onde se encontravam Colette e Claire, sentadas ao pé do estrado. À sua entrada, se levantaram. Sobre o estrado havia um fogareiro redondo só com uma boca. Anne-Marie pegou as correias no armário e fez amarrarem O estreitamente pela cintura e pelos joelhos, com o ventre contra uma das colunas. Também amarraram suas mãos e seus pés. Perdida no seu terror, sentiu a mão de Anne-Marie sobre suas nádegas, indicando onde se devia colocar os ferros, ouviu o sibilo de uma chama e, num silêncio total, a janela que se fechava. Não podia suportar. Uma única dor abominável a atravessou e a jogou em suas correias, uivante e enrijecida; nunca soube quem tinha afundado os dois ferros em brasa ao mesmo tempo na carne de suas nádegas, nem de quem era a voz que contava lentamente até cinco, nem pela ordem de quem tinham sido retirados. Quando a desamarraram, caiu nos braços de Anne-Marie, e teve tempo de vislumbrar antes que tudo rodasse e se escurecesse ao seu redor, e que finalmente todo sentimento a abandonasse entre duas ondas noturnas, o rosto lívido de Sir Stephen.
Sir Stephen levou O para Paris dez dias antes do fim de julho. Os ferros que furavam o lóbulo esquerdo sob o seu ventre e que diziam com todas as letras que era propriedade de Sir Stephen, desciam até um teço das coxas, e a cada passo balançavam entre suas pernas como um batente de relógio, o disco gravado sendo mais pesado e mais longo do que o anel onde estava pendurado. As marcas impressas pelo ferro em brasa, com três dedos de altura e com a metade da sua altura de largura, afundavam-se na carne como uma goiva, com cerca de um centímetro de profundidade. Bastava roçá-las de leve, para percebê-las sob o dedo. Destes ferros e desta marca, O sentia um orgulho insensato. Se Jacqueline estivesse aí, em vez de tentar esconder-lhe que os usava como tinha feito com as marcas dos golpes de chibata que Sir Stephen tinha-lhe infligido nos últimos dias antes de sua partida, teria corrido à sua procura para mostrá-los. Mas Jacqueline só voltaria dentro de oito dias. René também não estava. Durante esses oitos dias, a pedido de Sir Stephen, O mandou fazer alguns vestidos para o verão e alguns vestidos para a noite, muito leves. Foram-lhe permitidos apenas dois modelos com algumas variantes: um, com um fecho eclair que se abria e fechava de cima a baixo (O já possuía alguns semelhantes) e o outro composto de uma saia em leque que se arregaçava com um gesto, mas sempre com um cinturão que subia até os seios, e usada com um bolero fechado no pescoço. Bastava tirar o bolero para que os ombros e os seios ficassem nus, e mesmo sem tirar o bolero, bastava abri-lo quando se desejasse ver os seios. Roupa de banho era impossível, O não podia usá-la: os ferros de seu ventre teriam ultrapassado o maiô. Sir Stephen disse-lhe que neste verão, quando fosse se banhar, iria nua. O tinha percebido que a todo momento, quando se encontrava perto, mesmo não a desejando e por assim dizer maquinalmente, ele gostava de segurá-la sob o ventre, puxando seus pelos, abrindo-a e penetrando-a com a mão por muito tempo. O prazer que ela própria sentia quando possuía Jacqueline úmida e ardente envolvendo sua mão, era testemunho e garantia do prazer de Sir Stephen. Compreendia que não quisesse que isso se tornasse menos fácil.

Com os twills listrados ou de bolinhas, em tonalidades cinza e branco, e azul-marinho e branco que escolheu, com a saia plissada e o pequeno bolero justo e firme, ou com roupas mais severas em cloqué de náilon preto, apenas ligeiramente maquilada, sem chapéu e com os cabelos soltos, O parecia uma jovem bem-comportada. Por toda a parte em que Sir Stephen a levava, tomavam-na por sua filha ou por sua sobrinha, tanto mais que, enquanto ele a tratava com intimidade, continuava a tratá-lo respeitosamente. Sozinhos em Paris, passeando pelas ruas a olhar as vitrinas, ou ao longo dos cais onde as calçadas eram poeirentas, pois estava muito seco, viam, sem espanto, os passantes sorrirem para eles como se faz para as pessoas felizes. Às vezes Sir Stephen levava-a para o canto de um portão ou sob o arco de um prédio, sempre algum lugar escuro, de onde subia um odor de adega, e a beijava dizendo-lhe que a amava. O prendia seus saltos altos no degrau onde em geral o portão é recortado. Percebia-se um fundo de quintal onde as roupas de baixo secavam nas janelas. Encostada a um balcão, uma moça loura olhava-os fixamente, um gato passava entre suas pernas. Passearam assim no Gobelins, em Saint-Marcel, na rua Mouffetard, no Temple, na Bastille. Uma vez Sir Stephen inesperadamente entrou com O num miserável hotel de passagem, onde o proprietário primeiro quis que preenchessem as fichas, mas logo disse que, se fosse apenas por uma hora, não era necessário. O papel do quarto era azul com enormes peônias douradas e a janela dava sobre um poço de onde subia o cheiro das latas de lixo. Por fraca que fosse a lâmpada à cabeceira da cama, podia-se ver pó-de-arroz derrubado e alguns grampos sobre o mármore da lareira. No teto, acima da cama, havia um grande espelho.

Uma só vez Sir Stephen convidou, para almoçar com O, dois de seus compatriotas que estavam de passagem. Veio buscá-la no cais de Béthune uma hora antes que estivesse pronta, em lugar de fazê-la vir à sua casa. O já tinha tomado banho, mas ainda não estava penteada, maquilada nem vestida. Viu com surpresa que Sir Stephen trazia na mão uma sacola que se usa nos clubes de golfe. Mas sua surpresa não durou muito: Sir Stephen disse-lhe para abrir a sacola. Esta continha diversas chibatas de couro: duas em couro vermelho mais ou menos grossas, duas muito finas e longas em couro negro, um chicote flagelante com correias de couro verde, trançadas e formando um cacho nas extremidades, um outro feito de cordinhas com nós, um chicote para cachorro que consistia numa única correia grossa de couro e cujo cabo era de couro trançado e, por fim, braceletes e correias de couro como os de Roissy. O arrumou tudo, lado a lado, sobre a cama aberta. Por maior que fosse o hábito ou a resolução que tivesse, tremia; Sir Stephen tomou-a em seus braços. "O que prefere, O?", disse-lhe. Mas ela mal podia falar, e já sentia, antecipadamente, o suor correndo sob suas axilas. "O que prefere?", repetiu. "Bom", disse diante do seu silêncio, "primeiro vai me ajudar". Pediu-lhe pregos, e tendo se decidido como dispô-las para fazer uma decoração com os chicotes e as chibatas entrecruzadas, mostrou a O que à direita de sua penteadeira, na frente da cama, um painel de madeira entre a penteadeira e a lareira estava prestes a recebê-los. Fixou os pregos. Nas extremidades dos cabos dos chicotes e das chibatas, havia argolas que se podia pendurar nos ganchos dos pregos X, o que permitia tirar e recolocar facilmente cada chicote, com os braceletes e as cordas enroladas. O teria assim, diante de sua cama, a panóplia completa dos seus instrumentos de suplício. Era uma bonita panóplia, tão harmoniosa quanto a roda e as tenazes nos quadros que representam Santa Catarina mártir, ou quanto o martelo e os pregos, a coroa de espinhos, a lança e as varas nos quadros da Paixão. Quando Jacqueline voltasse ... mas tratava-se justamente de Jacqueline... Precisava responder à pergunta de Sir Stephen; como não conseguia, ele próprio escolheu o chicote para cães.

No La Pérousse , numa minúscula sala privada do segundo andar, onde personagens em estilo Watteau , em cores claras um pouco apagadas, sobre as paredes escuras, lembravam atores de teatro de bonecas, O foi instalada sozinha num divã, com os dois amigos de Sir Stephen, um à sua direita e um à sua esquerda, cada um em sua poltrona, e Sir Stephen à sua frente. Já tinha visto um dos homens em Roissy, mas não se lembrava de que a tivesse possuído. O outro era um rapaz alto, ruivo, com os olhos cinzentos, que certamente ainda não tinha vinte e cinco anos. Sir Stephen disse-lhes em duas palavras por que tinha convidado O e o que ela era. Mais uma vez O se surpreendeu, ao escutá-lo, com a brutalidade de sua linguagem. Mas também, como queria que fosse qualificada, senão como prostituta, uma moça que consentia, diante de três homens, sem contar os garçons do restaurante que ainda entravam e saíam, o serviço não tendo terminado, em abrir seu vestido para mostrar os seios, cujos bicos estavam pintados e dos quais via-se também, por dois sulcos violetas através da pele branca, que tinham sido chicoteados? A refeição foi longa, e os dois ingleses beberam muito. Durante o café, quando foram trazidos os licores, Sir Stephen empurrou a mesa para a parede oposta, e depois de ter levantado a saia de O para que seus amigos vissem como estava marcada e ferrada, deixou-a com eles. O homem que tinha encontrado em Roissy logo apoderou-se dela, exigindo imediatamente, sem deixar sua poltrona nem tocá-la sequer com a ponta dos dedos, que se ajoelhasse diante dele, que retirasse seu sexo e o acariciasse até chegar ao gozo em sua boca. Depois, fazendo ainda com que o deixasse novamente composto, partiu. Mas o rapaz ruivo, que a submissão de O, seus ferros, e as lacerações que tinha visto em seu corpo transtornavam, em vez de atirar-se sobre ela como O esperava, tomou-a pela mão, desceu com ela a escada sem um olhar para os sorrisos dos garçons e, tendo chamado um táxi, levou-a para seu quarto de hotel. Só deixou-a partir tarde da noite, depois de ter possuído com frenesi seu ventre e suas nádegas, deixando-a contundida, tão rígido e espesso era, e enlouquecido como estava pela súbita liberdade que pela primeira vez experimentava de penetrar uma mulher duplamente, assim como fazer-se beijar por ela do modo como acabava de ver que se podia exigir dela (e que nunca tinha ousado pedir a ninguém). No dia seguinte, às duas horas, quando O chegou na casa de Sir Stephen, que a tinha mandado chamar, encontrou-o com o rosto sério em um aspecto envelhecido. "Eric ficou loucamente apaixonado por você, O", disse-lhe. "Veio esta manhã me suplicar que devolvesse sua liberdade, e dizer-me que queria se casar com você. Quer salvá-la. Você vê o que faço com você sendo minha O; e sendo minha, não é livre para recusar, mas continua sendo livre, você sabe, para recusar ser minha, Foi o que lhe eu disse. Deverá voltar às três horas" O pôs-se a rir. "Não acha que é um pouco tarde?", perguntou. "Vocês são loucos, os dois. Se Eric não tivesse vindo esta manhã, que faria de mim esta tarde? Iríamos passear, simplesmente? Então vamos passear; ou talvez não teria me chamado? Nesse caso, vou embora..." "Não", continuou Sir Stephen, "tê-la-ia chamado, O, mas não para passear. Eu queria..." "Diga". "Venha, será mais simples" Levantou-se e abriu uma porta na parede diante da lareira, simétrica à que se usava para entrar no seu escritório. O sempre achou que era uma porta de armário condenada. Viu uma cabine muito pequena, recentemente pintada e forrada de seda vermelho-escura, cuja metade era ocupada por um estrado arredondado, flanqueado por duas colunas, idêntico ao estrado da sala de música de Samois. "As paredes e o teto estão forrados de cortiça, não é?", disse O "e a porta acolchoada; e fez instalar uma janela dupla?" Sir Stephen fez que sim com a cabeça. "Mas desde quando?" "Por que esperei até hoje? Porque esperei para fazê-la passar entre outras mãos além das minhas. E agora vou puni-la por isto. Nunca a puni, O". "Mas eu sou sua", disse O, "castigue-me. Quando Eric chegar..."


Uma hora mais tarde, levado à presença de O, grotescamente aberta entre as duas colunas, o rapaz empalideceu, balbuciou e desapareceu. O achava que nunca mais ia revê-lo. Reencontrou-o, porém, em Roissy, no fim do mês de setembro, quando fez com que a entregassem a ele por três dias seguidos e maltratou-a selvagemente.




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