Tuesday, November 20, 2018

BARBA: TER OU NÃO TER... (por Wilson Weigl)



O reflexo no espelho não mente: sua barba está por fazer há alguns dias, mas você, cansado do ritual, vem protelando a lâmina. A saída? Deixá-la crescer e adotar um novo visual. Pois saiba que, ao assumi-la, você estará passando uma nova mensagem – talvez até se transformando em um novo homem. Não é exagero. Basta olhar para a história para entender o impacto que os pelos faciais exercem na identidade masculina. Do homem das cavernas a Karl Marx, de Aristóteles a George Clooney, não há como dissociar a barba do que essas pessoas representaram (ou quiseram representar).

“Desde a Antiguidade a barba simboliza poder, autoridade e sabedoria”, diz o historiador Dante Gallian, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Reis, imperadores e sultões ostentavam pelos faciais como prova do poder que era conferido a eles pelos próprios deuses – geralmente barbudos também. Para os sábios, magos e sacerdotes, a barba longa (branca, de preferência) era evidência palpável do seu grau de conhecimento. Na Grécia Antiga, a moda entre os grandes pensadores, como Sócrates e Aristóteles, era ser barbudão. Até que Alexandre, o Grande, literalmente impôs uma nova tendência: para evitar que seus soldados fossem agarrados pela barba, ordenou que todos escanhoassem seus rostos. Já em Roma a história foi outra. Os primeiros imperadores romanos, como Augusto, Cícero e Tito, ostentavam um visual liso. O motivo, segundo estudiosos, estaria na ojeriza aos bárbaros (barbudos e cabeludos), seus grandes inimigos na época. De fato, ao longo da história, são diversos os casos de uso da barba como forma de diferenciação. Escravos, por exemplo, eram invariavelmente obrigados a ter o rosto liso se a barba estivesse em voga na elite (e vice-versa).

No final do século 19, uma nova tendência cai no gosto dos poderosos, inclusive no Brasil República. “Até então barbas e cabelos brancos expressavam sobriedade e respeito, mas não demorou muito para que as barbas escuras e até as tinturas fizessem sucesso entre os republicanos que aspiravam ao poder no País”, explica Denise Bernuzzi de Sant’Anna, professora de história da PUC-SP e autora do livro História da beleza no Brasil. Quase como bandeiras, a moda de barbas e bigodes passa a acompanhar os vaivéns da ordem mundial. “Na época da Revolução Industrial, os operários deviam ter a cara limpa, para evitar que os pelos se enroscassem nas máquinas”, lembra Gallian. Em contraponto a essa “moda” das classes mais baixas, pelos abundantes passaram a ser privilégio de artistas e intelectuais, como o filósofo alemão Karl Marx. A Primeira Guerra Mundial provoca outra reviravolta estética, estabelecendo o rosto bumbum de bebê como novo padrão masculino. “Rodolfo Valentino, maior ator do cinema mudo, descarta a barba como símbolo de virilidade e impõe o rosto liso como atributo de sedução”, comenta a professora da PUC-SP.

Os rostos lisos provavelmente reinariam até hoje, não fosse a moda da barba crescida que tomou proporções mundiais nos últimos anos, a ponto de causar tremendo impacto em empresas como Gillette e Braun, que experimentaram uma queda de até 15% nas vendas de lâminas e barbeadores. O que, na avaliação do professor Dante, tem uma explicação sociológica. Ele atribui o fenômeno ao resgate da imagem do “homem de verdade”, colocada de escanteio em meio às mudanças e inversões dos papéis masculinos e femininos na sociedade. “Assim como as mulheres se ‘masculinizaram’ para enfrentar o mercado de trabalho, o homem se ‘feminilizou’, assumindo novos papeis em casa, e com maior liberdade para assumir seu lado sensível”, diz Dante. Os homens, segundo eles, se ressentiram da falta dessa imagem de masculinidade perdida nas últimas décadas. Resultado? Voltaram a adotar a barba como símbolo dessa ressurreição. Mas essa não é a única vertente dos barbudos atuais. Que o digam os adeptos da subcultura hipster (cuidado, eles não suportam serem chamados assim). Modernos e antenados, eles elegeram a barba longa e cheia, ao estilo lenhador, como um de seus principais símbolos estéticos. Ou seja, se você está com preguiça de fazer a barba e anda meio desleixado, aproveite. Antes que a moda passe.

(publicado originalmente na Revista STATUS em Julho de 2015)



No comments:

Post a Comment