ENTREVISTA
COM JENNIFER GARNER
(publicado
em DESTAK, Portugal, em 26-09-2018)
Se pensam que
o mundo de Jennifer Garner é assim como ela o apresenta, acreditem. Sim, é
verdade que aparece quase sempre impecável e sensata, que a imagem bem polida
tem ares plausíveis de vizinha acessível num qualquer subúrbio relvado, que o
seu tom de baunilha-americana mostra dela uma faceta prazenteira. Tudo isso é,
de caras, inegável. Mas não pensem que, por trás da silhueta dela, é tudo um
mar de rosas.
Para começar,
não é por acaso que ela se encontra aqui à nossa frente, neste seu palco do
estrelato. Não foi meramente descoberta em cafetaria de esquina ou em passagem
de moda. Desde criança que faz teatro, que insiste em montar palco em tudo que
é festa de anos e em ser ela a fazer rir os outros com a sua boca pintada de
palhaço. Quando se tornou famosa, com a série televisiva Alias, o formato
televisivo era antigo, quer dizer, havia que fazer 23 episódios por ano, as
resmas de guião surgiam às catadupas e as necessárias acrobacias físicas eram
intermináveis.
Depois, quando
a sua arte e labor foram bastante eclipsados pelo casamento com o oscarizado e
garanhão Ben Affleck, o mar de rosas dela adquiriu tendência para murchar. Se a
virem nos tabloídes a socorrer o marido de mais uma maratona de uísque quando
ele devia era estar na clínica de reabilitação, ficam com uma ideia do que a
vida dela também é.
O resto do
tempo? Foge com os filhos dos fotógrafos que, rosnando, a rodeiam. Mulher de
armas e beleza alada das guerras olímpicas, não se intimida nunca. No novo
Peppermint vai outra vez à luta. Um dia vai poder descansar mas, por enquanto,
vamos conhecer esta força da natureza feminina.
Os seus filhos
estão agora mais crescidos. Ficou mais livre para, por exemplo, dar asas à sua
carreira no cinema?
Acaba por não
ser tão simples quanto isso. Uma pessoa pensa sempre que, se as crianças já não
são bebés, a mãe fica com mais tempo para se dedicar ao trabalho, ao emprego. A
realidade é um bocado mais complicada porque, se falamos dos meus filhos, o que
vai fazer 12 anos precisa cada vez mais de mim; e o que vai agora 9 anos também
sente uma necessidade enorme de companhia. Por outro lado, sinto que eles estão
a amadurecer e a ficar um bocadinho mais autónomos. Seja como for, passei os
últimos dois ou três anos afastada do público e meio fechada na nossa rotina,
em casa a fazer sanduiches e a preparar lanches para a escola. Uma correria que
até me agradou. Fiquei feliz por me ter dedicado a essas obrigações. Também foi
uma época que me permitiu esticar os músculos, pensar no que é importante,
preparar-me para regressar ao trabalho. Agora, voltei. E os meus filhos estão
excitadíssimos com os meus projetos, percebem que o meu trabalho é importante
para mim, estão a par do que se passa.
Mesmo sem ter
acesso aos pormenores da sua vida privada dá para entender que a sua capacidade
de organização é sobrenatural. Qual é a chave do sucesso?
Oh meu Deus,
acho que só consigo fazer tudo porque tenho montes de informação no meu
telemóvel. E no computador. Todas as horas são pré-organizadas. Escrevo tudo
num papel. Ou seja, o horário vigente aparece-me no computador e também tenho
os pormenores numa folha de papel. Estou atenta em duas frentes. Além disso,
tenho assistentes que me lembram o que devo fazer e que me perguntam se já considerei
todos os ângulos da minha rotina. Acho que, qualquer que seja o dia,
confirmamos e voltamos a confirmar o plano umas 50 vezes. Ou mais. É muito
engraçado.
Qual foi a
última peça de arte que a sensibilizou e emocionou? Pode ser um texto, música,
pintura, cerâmica, o que for. Refiro-me agora a um grande momento em que tenha
sentido uma enorme torrente emocional.
Sim, um dos
salmos cantados na igreja. Quando é que foi? Que dia é hoje? Segunda-feira?
Pois, foi ontem que senti isso. O título era Nas Asas da Águia. A letra era
mais ou menos assim: «O Senhor criar-te-á nas asas de uma águia celeste, capaz
de irromper da noite e escuridão, a luz será tua para que brilhes no que
fizeste, para que Ele te tenha enfim na palma de Sua mão”.
Ir à missa é
algo que vê como vital na sua rotina semanal?
Não vou dizer
que sou dogmática mas acho que não seria exagero alegar que a minha semana é
mais feliz se lhe der início com uma ida à missa. É algo que me liga à
infância. Por exemplo, aquela letra que referi é a favorita da minha mãe. Basta
ouvir as primeiras notas e desfaço-me em lágrimas. Lembro-me de cantar aquilo
tendo a minha irmã ao lado. Cantávamos juntas. Portanto, não se trata uma
dessas idas à missa em que tudo se reduz a uma rotina ou a algo preordenado. É
um sentimento. É uma ligação. É algo muito importante que estou a tentar deixar
aos meus filhos. Além do mais, quando uma pessoa vai à igreja há sempre
momentos de interação com a comunidade. Está lá toda a gente. Agora, não pense
que sou fanática ou algo assim. Vou porque gosto.
Pareceu-me que
este novo filme, Peppermint, parece refletir as manchetes nos jornais sobre o
movimento #MeToo e o novo ativismo civil, feminista. Há uma mensagem de poder e
afirmação. Pensou nisso durante as filmagens? Não quero atribuir ao filme uma
mensagem que não está lá…
Lembro-me de
termos comentado sobre isso, exatamente porque os acontecimentos estavam a
desenvolver-se à nossa frente, em todo o lado, durante a fase das filmagens.
Portanto, sim, concordo que esta história também pode servir de resposta à
frustração enorme sentida pelas mulheres. Falo agora de todas as mulheres que
se sentem abusadas, exploradas, ignoradas, esquecidas a um canto porque ninguém
as ouve. Ora bem, no nosso filme, a minha personagem, Riley North, decide fazer
justiça de outra forma.
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